sábado, 16 de abril de 2011

Cura.


Cada um de nós, velhos ou novos, felizes ou miseráveis, bonitos ou feios, fortes ou fracos, mulheres ou homens, encaramos as cinco fases da dor. De maneiras diferentes ou de igual modo, todos nós as vivemos e sobrevivemos.

 - Negação
Primeiro negamos. Recusamos tal pacto, fugimos da sombra, procuramos o botão para voltar atrás. Damos um passo contra a nossa sombra, esbarramos com o passado que era tão feliz, tão genuíno, tão fácil.

 - Ira
Estamos determinados em combater o real, em viver com sobras de memórias, de histórias, de corpos, de vidas. Judiamos jezebel, incendiamos o inferno e afogamos o céu. Fervemos o sol. Congelamos a lua. Choramos de raiva. O medo bate à porta, devagarinho e pé ante pé, vai entrando, sem pedir licença, e apaga os fogos, traz a chuva, a neve e a consciência.

 - Negociação
Debatemos soluções. Chamamos a matemática, as ciências, a lógica, a vida! Gritamos por compreensão, lutamos e não ancoramos. A esperança ainda sobrevive e ultrapassa a dor. Já temos medo, porque estamos conscientes, ainda que não totalmente. Não nos resignamos e tentamos até nos apercebermos de que não vale a pena lutar por alguma coisa que já se instalou em nós, que trouxe malas e bagagens cheias, para uma temporada longa.

 - Depressão
Sabemos que está em nós e que vai alastrando, até nos cobrir de pó, de areia, escondendo-nos do mundo. Lentamente nos tira o ar. Mata tudo à nossa volta, sem piedade. Começamos a deturpar sons, confundimos vozes, pessoas, cores. Todos se vão embora, sem dizer adeus, sem nos dar um beijo e dizer que vai ficar tudo bem. Antes, desaparecem com uma cara mais desfeita do que a nossa, marcada pelo realismo. Estamos no fundo do poço e já ninguém tira água dele. Preferem mergulhar no álcool e festejar o imaginário. Mas estamos a água, e a água não salva ninguém da tristeza.

 - Aceitação
Por fim, resignamo-nos. Achamos que vamos sobreviver, vamos ultrapassar e ter histórias para contar. Achamos que a luta nos vai tornar diferentes, especiais. Prometem-nos medalhas e taças cheias de bravura e orgulho. Mas nessa altura, não precisamos de mais nada. Surgem os sorrisos e abraços despropositados, que, agora, não servem de nada, porque já estamos no pódio e já recebemos as flores, já ouvimos o hino e já choramos de alegria.



O mais engraçado é que celebram connosco as nossas vitórias, ficam alegres com lutas que acham ser deles também, mas não são!
São lutas só nossas, que travamos sozinhos, sem ajuda, porque se foram todos embora, quando ainda não sabíamos ser capazes de vencer! Foram embora, não lutaram, não viram, não sentiram na pele a dor que a dor traz. Não nos olharam nos olhos com medo de serem mais cobardes que nós porque não eram eles os protagonistas. Choraram fora de portas, longe, para que ninguém ouvisse. Não choraram connosco, não partilharam o mesmo medo, porque fugiram do que mais assusta.


Tudo se perde. Nada é para sempre. Nem tu. Nem tu. Nem eu. O que és hoje, não serás amanhã, e ainda não aprendeste a viver com isso. Só depois de perceberes a maior lição de vida que a dor te dá é que vais entender que o que fizeres hoje, pode matar-te amanhã, ou então, tornar-te mais forte. Vacinar-te. Curar-te.


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